O texto abaixo é uma reportagem do Dr. DRAUZIO VARELLA, publicada no jornal Folha de São Paulo de hoje. A leitura é um pouco longa, mas vale a pena perder alguns minutos porque o assunto é de uma utilidade extraordinária para a nossa saúde.
~~~~~~~~~~~~~~~~~~
A mortalidade está em queda no mundo
inteiro, exceto na Europa Oriental e em algumas partes da África.
Já aconteceu no passado. Entre
nossos ancestrais australopitecídeos que surgiram na África há 4,4 milhões de
anos, a vida acabava depressa: para cada 80 privilegiados que resistiam até os
15 anos, 79 morriam antes de completar 30 anos.
Já no Homo sapiens, que viveu
na Europa entre 44 mil e 10 mil anos atrás, metade dos que sobreviviam até os
15 anos chegava aos 30.
Graças ao advento das vacinas,
antibióticos, saneamento básico e à qualidade da alimentação, a expectativa de
vida no século 20 duplicou em diversos países.
Fatores de risco como cigarro,
consumo de álcool, sedentarismo, obesidade e nutrição inadequada, por via
direta ou por ação indireta através da hipertensão arterial ou do diabetes, são
os responsáveis pela maioria dos males que afligem as sociedades modernas.
1) Cigarro
A prevalência vem caindo nos
países de língua inglesa, no norte e centro da Europa e na América Latina,
tendência acompanhada da redução de mortes por câncer e doenças
cardiovasculares. O aumento contínuo da mortalidade por câncer de pulmão entre
as mulheres europeias reflete o fato de que em alguns países do sul e do leste
europeu mais de 40% das mulheres fumam.
No Brasil, cerca de 15% dos
adultos são fumantes, número mais baixo do que nos Estados Unidos, e muito
menor do que na Europa (com exceção da Suécia), no leste da Ásia e algumas
partes da África. Nos países situados abaixo do deserto do Saara, a
popularidade do cigarro é menor.
Fumantes ativos e passivos
pagam preço alto: 6,3 milhões de mortes anuais. Mais de 6% das doenças
existentes no mundo atual são provocadas pelo cigarro. É a principal causa
evitável de morte.
2) Consumo de álcool
Beber com moderação pode
reduzir a incidência de problemas cardiovasculares e de diabetes,
principalmente em pessoas com fatores de risco para essas enfermidades.
Ingerir quantidades exageradas
num único dia, no entanto, além de provocar acidentes, aumenta o risco de
complicações cardiovasculares e cirrose hepática.
Em países produtores de vinho,
como Itália ou França, o consumo de álcool diminuiu nas últimas décadas,
período em que duplicou na Dinamarca e Inglaterra e aumentou em países
asiáticos como Japão, China e outros.
O abuso de bebidas destiladas é
a principal causa de doenças na Europa Oriental. Na Rússia e nos países da
antiga União Soviética, ele é responsável por 30 a 50% das mortes de jovens e
de homens de meia-idade.
3) Obesidade
Há associação clara entre
obesidade e mortalidade geral. Ganhar peso aumenta o risco de diabetes,
hipertensão, ataque cardíaco, derrame cerebral, câncer, insuficiência renal e
artrite.
São poucos os países em que o
peso médio dos habitantes não aumentou. A prevalência global da obesidade
duplicou entre 1980 e 2008. Em valores absolutos, os maiores aumentos ocorreram
nos Estados Unidos, seguidos pela China, Brasil e México.
A prevalência varia de 2% em
Bangladesh a mais de 60% em algumas ilhas do Pacífico.
O excesso de peso é responsável
por cerca de 3,4 milhões de mortes anuais. A ele estão associadas patologias
com baixas taxas de mortalidade, mas causadoras de períodos longos de
incapacitação.
4) Nutrição e dieta
Estudos observacionais
demonstram benefícios em reduzir a quantidade de sal e substituir as gorduras
saturadas pelas poli-insaturadas. Dietas pobres em frutas, vegetais, grãos
integrais, nozes, amêndoas e sementes acompanhadas de excesso de sal contribuem
com 1,5% a 4% do total de doentes do mundo.
5) Atividade física
Já na década de 1950, os
estudos mostravam os benefícios da atividade física. A energia gasta em
movimento diminui drasticamente à medida que os países se urbanizam e se
desenvolvem, fator que contribui decisivamente para o aumento das doenças
degenerativas.
Está em curso um período de
transição epidemiológica. O mundo sai da fase das mortes precoces por doenças
infectocontagiosas, para entrar em outra, caracterizada por maior longevidade,
inversão da pirâmide populacional e alta incidência de doenças degenerativas.
~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~
Drauzio Varella é médico cancerologista. Por
20 anos dirigiu o serviço de Imunologia do Hospital do Câncer. Foi um dos
pioneiros no tratamento da Aids no Brasil e do trabalho em presídios, ao qual
se dedica ainda hoje. É autor do livro "Estação Carandiru" (Companhia
das Letras). Escreve aos sábados, a cada duas semanas, na versão impressa de
"Ilustrada".
Nenhum comentário:
Postar um comentário